MEMÓRIAS LITERÁRIAS
Enquanto meu avô contava-me suas histórias passavam imagens em minha cabeça parecendo que eu estava junto dele nesta incrível viagem...
“A hora da partida se aproxima. Inquietação total. Ouvia-se o toc-toc das patas dos cavalos a bater nas pedras do calçamento da rua principal onde reuníamos para pegar a estrada. Era pouco mais das três da manhã.
Era o meu primeiro dia de tropeiro. Tudo pronto: o alforje, a capa de chuva, espora, chicote...Ia um ou dois cargueiros levando as panelas, a carne seca, o feijão, a farinha, as cobertas, umas redes de dormir e outras coisas necessárias para nossa viagem.Cada tropeiro procurava enfeitar mais a sua montaria com pelego, peitoral, rabicho, porta-capa de babado - era uma competição de ornamentos.Já estávamos prontos e em poucos minutos estaríamos percorrendo as estradas levando mais uma tropa para ser negociada em São Paulo – eram mais de trezentos animais entre burros, mulas e jumentos. Fomos saindo passo a passo...
Seriam quarenta dias consecutivos de viagem, quarenta noites dormindo pelas estradas, em fazendas já acostumadas a receber tropeiros na ida e volta de suas longas viagens. Em algumas dormíamos em paiol, em outras na varanda, ou em quartinhos destinados aos empregados, até mesmo na coberta do curral. Nossas refeições eram feitas nas estradas – farinha, feijão,ovo e torresmo, tudo misturado – o “feijão-tropeiro” – daí o nome desse famoso prato.
Em nossas paradas nas cidades havia diversão, sempre o “Deli”, um dos companheiros mais festeiros,arrumava uma “radiola” - toca- discos daquela época - e juntava muita gente pra dançar e prosear – que é bem semelhante aos passeios a cavalo que fazemos aqui em Santo Antônio e que chamamos “Cavalgoles” por ser somente pelo prazer de cavalgar, tomar uns goles nas paradas e dançar um forró.
Bem, assim se passavam os dias até chegarmos em Passos , cidade na divisa de Minas Gerais com São Paulo. Lá encontrávamos os paulistas que iriam comprar os animais e também aceitávamos trocas. Depois das negociações voltávamos, nos divertindo, amansando burros bravos e colecionando histórias pra contar.
Lembro-me dessa viagem como se fosse ontem, naquela época eu tinha 17 anos... É!... Já se passaram 53 anos! (Como o tempo passa rápido!)”
(Texto baseado na entrevista de Altamirano , meu avô)
ALUNA: Laura Ferreira Morais, 7º ano, 2010
Antônio Rufino da Silva é meu avô, tem 100 anos, mora em minha casa e é com prazer que narro uma de suas lembranças.
“Morei grande parte de minha vida na Fazenda Boa Vista, na localidade de Lagoa Seca aqui em Santo Antônio do Rio Abaixo - fazenda de extensos campos verdes, cheia de frondosas árvores enfeitando aquela vastidão de chão coberto de verde! – e, que hoje, já não existe mais...(seus olhos brilhavam ao me contar suas recordações , pareceu-me que ele havia se transportado numa máquina do tempo e eu fui junto com ele ao seu passado).
Minha vida de criança era de adulto, o trabalho já nos castigava desde cedo. Minha mãe sempre dizia:
_ Menino, vai trabalhar! Não quero que fique marmanjo preguiçoso!
No outro dia, “meiando” cinco horas da manhã pegava a marmita e partia para o “aricho” – moitas de mato no meio do pasto, lugar “bem sujo”. Meu pai e eu roçávamos o dia inteiro de sol a sol.
O ordenado – salário pelo trabalho realizado – que era bom, não tinha não! Trazíamos para casa uns mantimentos que era para alimentar dez irmãos e receber pessoas mais chegadas que apareciam para almoçar e “ bater um dedo de prosa”.
Para mim, brincar era só nas rezas de domingo. Lá brincávamos de roda e zorra – estas brincadeiras não existem mais, hoje as crianças são tristes, paradas, não são como as de antigamente! Logo que acabava a reza, no caminho de casa, eu sempre pedia meu pai para “chegar” na venda do Seu Silvestre da Costa Lage, ali na rua – olha, menino, este é o nome dessa rua, mas isso é outra história, depois eu te conto.
De longe a gente sentia o cheiro dos biscoitos torrando e juntava-se ao cheiro da fumaça escura que vinha do forno a lenha. Meu pai sempre comprava aqueles biscoitinhos brancos bem docinhos. Seu Silvestre sempre dava uns biscoitos a mais “de pinga”. Voltávamos pelos trilhos e eu com água na boca, já que papai não deixava comer nenhum biscoito antes de chegar em casa.
E como demorava a chegar! Meia hora parecia uma eternidade. Quando chegava em casa, comia os biscoitos – eram tão gostosos, coradinhos e torradinhos, que desmanchavam entre os dentes com uma suave cosquinha no céu da minha boca. Hum! Comia devagar para não acabar rápido.
Dá saudade desse tempo... hoje em dia, os biscoitos, as brincadeiras, o trabalho, é tudo diferente! Coisas ruins para a nossa saúde, muito diferente do que aprendi e acostumei a viver ... era uma época de muitas felicidades, que hoje venho lembrando e relembrando dia a dia , vida totalmente diferente do que levo hoje.
(Texto baseado no depoimento de Antônio Rufino da Silva, 100 anos)
ALUNO: Gustavo Silva Nascimento, 7º ano, 2010
VIRANDO CINZAS
Enquanto “Tia” Lúcia me contava essa história, eu mergulhava naquelas palavras, esquecendo o meu presente e, me sentia vivendo cada momento retratado, viajando em cada expressão e sentimentos.
“Santo Antônio do Rio Abaixo era uma cidade do tamanho da palma de minha mão, pacata, onde vivíamos uma vida bem simples e harmoniosa, isso há quase quarenta anos.
Essa cidade tinha o privilégio de ter uma das mais belas casas – era como se fosse uma fotografia de revista, irreal, uma miragem – grande, de dois andares, vistosa, toda assoalhada, com jardins por todo lado, imponente numa rua calçada de pedras, dando a sensação de um palácio, encantando a todos santantonenses.
Era a casa de minha tia Vera. Um dia decidiu se mudar para Belo Horizonte, procura de condições de vida que só a capital poderia lhe dar.
Por mais que não fosse de sua vontade, foi necessário vender a casa e quem a comprou foi um casal amigo: o Sr. Modesto e a Sra. Maria das Graças – ele, filho de um dos mais abastados fazendeiros de Santo Antônio e, ela, professora .Imediatamente mudaram para ela e com eles veio morar uma de suas irmãs – Maria do Socorro, cujo apelido era Nenen.
Naquela época preparar uma festa de casamento durava mais de uma semana e, era isso que acontecia na casa da “DasGraças” – uma festa de arromba para o casório de sua irmã Nenen com um cidadão ,filho de um importante fazendeiro da cidade vizinha. A união desse casal, com certeza, era uma grande felicidade para as duas famílias.
Toda a cidade assistia ao corre-corre dos preparativos, foram construídas mais fornalhas para dar vazão aos doces e carnes que eram preparados. Era trabalho intenso para muitas cozinheiras. Foram dias de labuta. Tudo quase pronto. Véspera do sonhado dia, mais trabalho e, portanto mais cansaço. Quando a última cozinheira deixou as fornalhas, conferiu uma por uma para ver se as brasas estavam bem tampadas com as cinzas para que no outro dia fossem reavivadas. Tudo em ordem, podia dormir para acordar mais cedo no grande dia.
Todos dormiam e de repente um clarão iluminava a casa e um cheiro estranho acordou a DasGraças - as chamas invadiam tudo, não deu tempo de salvar nada. Aquele fogo iluminando a casa como uma gigantesca lareira, dando gosto de ver! A lenha que estava na lareira, reacendera e como havia muita lenha , o fogo foi passando, a casa era de pau-a-pique e se espalhou facilmente queimando tudo.
E o casamento? Os noivos receberam a bênção do matrimônio e ainda teve uma festa improvisada, longe do banquete que virou cinzas junto com todo o enxoval da noiva.
Até hoje não dá pra acreditar no que aconteceu – sonhos viram cinzas.”
(Texto baseado no depoimento de Lúcia Martins do Santos)
ALUNA: Laura Ferreira Soares , 7º ano, 2010
NAQUELE TEMPO
Meu avô me contava as histórias de sua mocidade, recordava os fatos. Para mim não foi difícil imaginar como era aqui a mais de 60 anos, fui ouvindo suas palavras e tudo surgiu como num filme.
“ Tenho muitas lembranças de Santo Antônio, essa nossa pequena cidade de Minas Gerais, aliás, nem cidade era e sim um distrito de Conceição do Mato Dentro.
Na época da minha infância a vida era muito difícil. Para ir a escola, que era só até a quarta série, eu e meus irmãos vínhamos a pé, fazendo sol ou chuva, poeira ou barro! Depois da 4ª série, quem tinha recursos ia estudar fora – Belo Horizonte, Conceição do Mato Dentro ou outra cidade que oferecesse ginasial – quem não tinha, como eu, ficava para trabalhar na roça.
Também não havia transportes, nem para os doentes, esses, quando precisavam ser hospitalizados eram removidos em padiolas – colchões amarrados em bambus, levados em ombros de homem até o Morro do Pilar , onde havia ônibus para a capital de Belo Horizonte. Quando não precisavam ser hospitalizados eram curados pelo Dr. Seraphim Sanna, farmacêutico da região. Ele produzia os remédios e os enviava aos pacientes.
A região também não tinha luz elétrica. Vivemos muitos anos a luz de lamparinas e lampiões. Só por volta de 1980 é que começamos a vislumbrar a energia elétrica chegando em nossa cidade. A princípio era gerada por um motor a óleo, como esse óleo era caro, a energia era desligada às 23 horas o que fazia que todos se recolhessem nesse horário.
Hoje, resta-me a lembrança de um mundo totalmente diferente, uma vida dura, mas feliz!”
Depois de ouvir o que meu avô me contou, já era noite, olhei pela janela e pensei: como pode... essa cidadezinha já foi menor do que é!
(Texto baseado na entrevista de Altamirano , meu avô)
ALUNA: Anna Clara de Andrade Silva
LEMBRANÇAS
Enquanto meu avô contava a sua história , a imagem ia se formando em minha cabeça e eu fui entrando em sua narrativa...
“Santo Antônio sempre foi uma cidade pequena. Antigamente era menor ainda. Existiam poucas ruas, todas de terra. Havia muita poeira. As poucas casas eram bem simples, a maioria de pau-a-pique. Em todas elas o fogão era a lenha, que esquentava os moradores nas noites frias. Os móveis eram basicamente mesas, bancos, prateleiras e camas.
Os meninos brincavam com carrinhos de madeira e as meninas com bonecas de pano e sabugo de milho. Brincadeiras com bolas de meia e fruta-de-lobo também eram comuns, além de nadar no rio e pular no bagaço de cana no engenho.
Para estudar era muito difícil, principalmente para quem morava na roça. Tínhamos que vir de longe, a pé. A maioria estudava até a 4ª série, grau máximo de escolaridade que tinha na cidade. A maioria que concluía esse grau ficava trabalhando na roça. Quem tinha condições estudava fora, mas eram poucos!
Naquela época não tinha energia elétrica. Esta só chegou até aqui bem tempo depois. E essa cidade foi se transformando aos poucos: ruas de terra foram calçadas, novas ruas surgiram, casas antigas deram lugar a outras, bem mais modernas. Poucos casarões restaram para contar a história daquela época.
Não havia festas com todo esse som, esses shows com bandas nas festas populares. Faziam-se uns bailes, onde reuniam moças e rapazes ao redor de uma radiola – vitrola, som antigo onde se tocavam discos de vinil – e só! Olha, namorar antigamente era só sentar ao lado e às vezes, pegar na mão!
Hoje a vida é muito diferente! Dá saudade daqueles tempos!!! Mas vivo feliz com meus filhos e netos relembrando esse passado difícil, mas cheio de recordações boas!
(Texto baseado na entrevista de Altamirano , meu avô)
ALUNA: Vitória Andrade de Morais Santos, 7º ano, 2010)